O novo que se aproveita (e bem) do velho – Parte 1

Desde os tempos em que comecei a resenhar discos, reparei como as influências de grupos antigos são cada vez mais transparentes na forma de compor da nova geração de bandas. Ao escrever, tento sempre que possível não tecer comparações com discos anteriores ou até mesmo com álbuns clássicos que infiltraram no disco em questão. Todavia, na fase atual, tal tarefa está complicada. Um exemplo: não tem como falar do Interpol sem um resquício de citação sequer ao Joy Division. Tudo bem que em seu terceiro disco, os nova-iorquinos tentaram buscar sua identidade e fugir da penumbra que Ian Curtis deixou para o mundo.

Tentarei fazer uma rápida exposição do que ouvi e o que tive a oportunidade de apreender. Os suecos (que ultimamente rendem atenção no mundo da música) emularam de forma perfeita grupos que encantavam ouvintes nos anos 80. The Mary Onettes é um dos que mais assumem essa postura. As aberturas de suas canções sempre fazem uma referência à sonoridade oitentista. ‘Parece que já ouvi isso em algum vinil meu ou de meu irmão/pai’. ‘The Cure? Vai entrar a voz de Robert Smith’? ‘Guitarras de alguma música do Jesus And Mary Chain’? ‘Ian MacCulloch e seus poucos homens coelhos que restaram com algo novo’? Mas, os músicos contagiam tanto que não vou reclamar.

Os também suecos do Hearts Of Black Science abusam tanto dos sintetizadores marcantes dos 80 que pensamos que estamos sendo transportados 20 anos atrás e escutando algo inédito de algum ícone do techno-pop ou ainda algo do The Human League ou do Depeche Mode. Para o lado mais eletrônico, damos de cara com o duo eletrônico Studio, que até nos faz parecer ser alguma banda esquecida do grandioso catálogo da Factory (do finado Tony Wilson). Um pouco de New Order, de Happy Mondays e de Durutti Column. A mistura é perfeita, não? O som da dupla não tem vergonha de se espelhar na boa escola musical.

Para o lado melancólico então, nem se fala. Dariam mais dois textos tranqüilamente. Iliketrains, grupo de Leeds, adiciona paredes sobrecarregadas de guitarras, tudo em clima de acidez e amargura em letras esparramadas por um vocalista à la Stuart Staples. Então, diga-se de passagem, quase um Tindersticks com mais fúria e vigor. Olha a ironia: por sua vez, Tindersticks se apropria de excelentes referências como Leonard Cohen, Scott Walker e Nick Drake. Os escoceses do The Twilight Sad (foto) constroem suas letras que remetem a pesadelos de infância sobre bases de guitarras que lembram bandas do estilo shoegazer e que fizeram nossa alegria. Aquela turma que cantava olhando para seus próprios pés está sim bem representada. E tem o Maps que me lembrou muito um Chapterhouse, principalmente.

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2 comentários sobre “O novo que se aproveita (e bem) do velho – Parte 1

  1. Eu sempre digo que tem boas bandas. O problema é que muita gente anda esperando “a banda”, a sétima maravilha do mundo, o que acaba causando certa frustração. É verdade também que devido a facilidade de acesso a tantos nomes, muita coisa mediana ou fraca acaba recebendo atenção, e que há muita repetição, chupação… resta pesquisar, baixar, ouvir e escolher, e nada melhor do que ter para escolher. Ou será que as pessoas preferem aquela ápoca em que a gente lia a respeito nas revistas e ficava apenas a imaginar, sonhar, torcer para que algum dia pudesse ouvir aquilo numa versão nacional ou importada? Talvez estejamos vivendo a ressaca do excesso dos downloads.

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  2. Bela matéria! Suas observações foram perfeitas Eduardo.
    Na minha modesta opinião, ainda acho que nenhuma década produziu bandas com sonoridades proprías como os 80’s. Ao ouvirmos uma música do Cure, U2, The Smiths, The Cult, Echo, Depeche Mode, etc e etc, sabemos exatamente de quem se trata. Também acho que os últimos suspiros de inventividade foram o trip-hop e o acid-jazz (ou jazz-rap); o que na verdade acabam sendo nada mais do que fusões de dois gêneros musicais. Muitos artistas buscam o “novo” ou pelo menos alguma sonoridade própria combinando sons de estilos diferentes ou próximos; o que não deixa de ser uma solução. A verdade é que é difícil imaginar o surgimento (criação) de um estilo ou gênero musical completamente inédito, quando observamos toda a história da música até o instante momento! Uma boa influência não faz mal nenhum, o problema ocorre quando estamos tendo a nítida sensação que ouvimos algo “velho” em algo novo; o que chamaríamos de chupação ou completa falta de originalidade. Mas voltando ao início da matéria, realmente as influências são cada vez mais transparentes!

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